dezembro 28, 2007

Entrevista interessante


A Dra. Rita Levi tem 96 anos e recebeu o Premio Nobel de Medicina há 19 anos, quando tinha 77 !!! Nasceu em Turin, Itália em 1909 e obteve o titulo de Medicina na especialidade de Neurocirurgia. Por causa de sua ascendência judia viu-se obrigada a deixar a Itália um pouco antes do começo da II Guerra Mundial. Emigrou para os Estados Unidos onde trabalhou no Laboratório Victor Hamburger do Instituto de Zoologia da Universidade de Washington de St Louis. Os seus trabalhos com Stanley Cohen, serviram para descobrir que as células só começam a se reproduzir quando recebem a ordem para isso, ordem que é transmitida por umas substâncias chamadas factores do crescimento. Obteve o Premio Nobel de Fisiologia e Medicina no ano 1986, que partilhou com Stanley Cohen.
wwhttp://es.wikipedia.org/wiki/Rita_Levi-Montalcini

Reportagem de 22/12/2005

- Como vai celebrar os seus 100 anos?
-Ah, não sei se viverei até lá, e, além disso, não gosto de celebrações. No que eu estou interessada e gosto é do que faço cada dia.!
- E o que faz?
- Trabalho para dar uma bolsa de estudos para as meninas africanas para que estudem e prosperem ... elas e os seus países. E continuo investigando, continuo pensando.
- Não vai aposentar-se?
- Nunca! Aposentar-se é destruir cérebros! Muita gente se aposenta e se abandona... E isso mata o seu cérebro. E adoece.
- E como está seu cérebro?
-Igual quando tinha 20 anos! Não noto diferença em ilusões nem em capacidade. Amanhã vôo para um congresso médico.

- Mas terá algum limite genético ?
- Não. O meu cérebro vai ter um século...., mas não conhece a senilidade.. O corpo enruga-se, não posso evitar, mas não o cérebro!

-Como você faz isso?
- Possuímos grande plasticidade neural: ainda quando morrem neurónios, os que restam se reorganizam para manter as mesmas funções, mas para isso é conveniente estimulá-los!

- Ajude-me a fazê-lo.
- Mantenha o seu cérebro com ilusões, activo, faça-o trabalhar e ele nunca se degenera.
- E viverei mais anos?
- Viverá melhor os anos que vive, é isso o interessante. A chave é manter curiosidades, empenho, ter paixões....
- A sua foi a investigação cientifica...

-Sim e continua sendo.
- Descobriu como crescem e se renovam as células do sistema nervoso...
- Sim, em 1942: dei o nome de Nerve Growth Factor (NGF, fator do crescimento nervoso), e durante quase meio século houve dúvidas, até que foi reconhecida sua validade e em 1986, deram-me o prémio por isso.
- Como foi que uma menina italiana dos anos vinte se tornou neurocientista?
- Desde menina tive o empenho de estudar. Meu pai queria casar-me bem, que fosse uma boa esposa, boa mãe... E eu não quis. Fui firme e confessei que queria estudar.
- Seu pai ficou magoado?
- Sim, mas eu não tive uma infância feliz: sentia-me feia, tonta e pouca coisa... Os meus irmãos mais velhos eram muito brilhantes e eu sentia-me tão inferior...
- Vejo que isso foi um estímulo...
- O meu estímulo foi também o exemplo do médico Albert Schweitzer, que estava em África para ajudar com a lepra. Desejava ajudar os que sofrem, isso era o meu grande sonho...!

- E tem feito isso.., com a sua ciência.
- E, hoje, ajudando as meninas da África para que estudem. Lutamos contra a enfermidade, a opressão da mulher nos países islâmicos por exemplo, além de outras coisas...!

- A religião trava o desenvolvimento cognitivo?
- A religião marginaliza muitas vezes a mulher perante o homem, afastando-a do desenvolvimento cognitivo, mas algumas religiões estão tentando corrigir essa posição.

- Existem diferenças entre os cérebros do homem e da mulher?
- Só nas funções cerebrais relacionadas com as emoções, vinculadas ao sistema endócrino. Mas quanto às funções cognitivas, não tem diferença alguma.

- Por que ainda existem poucas cientistas?
- Não é assim! Muitos descobrimentos científicos atribuídos a homens, realmente foram feitos por suas irmãs, esposas e filhas.

- É verdade?
- A inteligência feminina não era admitida e era deixada na sombra. Hoje, felizmente, tem mais mulheres que homens na investigação científica: as herdeiras de Hipatia!
- A sábia Alexandrina do século IV...
- Já não vamos acabar assassinadas nas ruas pelos monges cristãos misóginos, como ela. Claro, o mundo tem melhorado algo...

- Ninguém tem tentado assassiná-la...
- Durante o fascismo, Mussolini quis imitar o Hitler na perseguição dos judeus..., e tive que me ocultar por um tempo. Mas não deixei de investigar: tinha meu laboratório em meu quarto...E descobri a apoptose, que é a morte programada das células!

- Porque existe uma elevada percentagem de judeus entre os cientistas e intelectuais?
- A exclusão estimula entre os judeus os trabalhos intelectuais: podem proibir tudo, mas não que pensem! E é verdade que tem muitos judeus entre os prémios Nobel...
- Como se explica a loucura nazista?
- Hitler e Mussolini souberam como falar ao povo, onde sempre prevalece o cérebro emocional por cima do neocortical, o intelectual. Conduziram emoções, não razões!
- Isto está acontecendo agora?
- Porque acha que em muitas escolas nos Estados Unidos é ensinado o creacionismo e não o evolucionismo?
- A ideologia é emoção, é sem razão?
- A razão é filha da imperfeição. Nos invertebrados tudo está programado: são perfeitos. Nós não. E, ao sermos imperfeitos, temos recorrido à razão, aos valores éticos: discernir entre o bem e o mal é o mais alto grau da evolução darwiniana!
- Você nunca se casou ou teve filhos?
- Não. Entrei no campo do sistema nervoso e fiquei tão fascinada pela sua beleza que decidi dedicar todo meu tempo, minha vida!
- Conseguiremos um dia curar o Alzheimer, o Parkinson, a demência senil?
- Curar... O que vamos conseguir será travar, atrasar, minimizar todas essas enfermidades.

- Qual é hoje seu grande sonho?
- Que um dia possamos utilizar ao máximo a capacidade cognitiva de nossos cérebros.

- Quando deixou de sentir ser feia?
- Ainda estou consciente de minhas limitações!

- Que tem sido o melhor da sua vida?
- Ajudar aos demais.

- O que faria hoje se tivesse 20 anos?
- Mas eu estou fazendo!!!!

(pequenas alterações para Português Europeu)

dezembro 13, 2007

O Burden do Cuidador

Os cuidadores informais de pessoas com Alzheimer, sobretudo aqueles que fizeram uma formação, estão familiarizados com a expressão 'burden do cuidador' que designa os efeitos negativos, o peso, o desgaste que a prestação de cuidados diários a uma pessoa com este tipo de demência pode provocar.

É sabido que essa prestação de cuidados pode prolongar-se por um período relativamente extenso de tempo e requer do cuidador uma disponibilidade total, a não ser que possa contar com a colaboração de outros elementos da família, o que nem sempre acontece.

Esse 'peso' afeta muitas vezes a saúde do cuidador, tanto do ponto de vista fisiológico como psicológico, isto é, é frequente a pessoa que cuida passar a precisar, ela própria, de cuidados.


dezembro 11, 2007

Demência - Prioridade em 2008

Comunicado à Imprensa da Alzheimer Europe: Instituições Europeias unem esforços para fazer da demência uma prioridade em 2008

6 de Novembro de 2007: Durante um debate organizado pela Associação Alzheimer Europe e moderado por Françoise Grossetêt, Membro do Parlamento Europeu (França), representantes de várias Instituições Europeias deram o apoio mais significativo, até hoje, na luta contra a doença de Alzheimer e outras formas de demência por forma a que as mesmas sejam tomadas em consideração nos planos das Instituições Europeias em 2008.

Ao celebrar a segunda publicação da Alzheimer Europe “Dementia in Europe”, dedicada à apresentação do apoio social prestado pelos Governos a pessoas com doença de Alzheimer, em vários países Europeus, Vladimir Spidla, Comissário Europeu para o Emprego, Serviços Sociais e Igualdade de Oportunidades, felicitou a Alzheimer Europe por evidenciar o impacto social da doença de Alzheimer e outras formas de demência, em pessoas diagnosticadas, bem como, nas suas famílias e cuidadores. Referiu, ainda, a necessidade de aperfeiçoamento da formação de médicos e prestadores de cuidados profissionais e das famílias cuidadoras para melhorar a qualidade dos cuidados e apoios das pessoas com demência. Em particular, referiu a importância da divulgação de boas práticas nesta área e da inclusão do impacto causado pela doença de Alzheimer na definição de futuras políticas para idosos e estratégias de cuidados de saúde.


Mais, aqui.


dezembro 03, 2007

Quem é?

Hoje olhaste para a tua fotografia e não te reconheceste.
Quem é? Não sei...
Como se te tivesses perdido de ti própria.

novembro 17, 2007

Foram...


Hoje foste passar a tarde num convívio de antigos colegas. Estiveste animada, como sempre, entre eles. No regresso não tinhas qualquer ideia de quais lá tinham estado, ou quantos. Os rostos e as vozes já se tinham afastado da tua lembrança. Não ficaram mais do que os momentos em que estiveram fisicamente presentes. Logo de seguida começaram a desaparecer...

Um novo dia virá

É imperioso acreditar que um crepúsculo não é um final apenas, mas um sinal inequívoco de que um novo dia virá, e com ele a esperança... talvez... quem sabe...

novembro 14, 2007

Choro!

José Gomes Ferreira


Choro!

Ninguém vê as minhas lágrimas, mas choro
as crianças violadas
nos muros da noite
húmidos de carne lívida
onde as rosas se desgrenham
para os cabelos dos charcos.

Ninguém vê as minhas lágrimas, mas choro
diante desta mulher que ri
com um sol de soluços na boca
— no exílio dos Rumos Decepados.

Ninguém vê as minhas lágrimas, mas choro
este sequestro de ir buscar cadáveres
ao peso dos poços
— onde já nem sequer há lodo
para as estrelas descerem
arrependidas de céu.

Ninguém vê as minhas lágrimas, mas choro
a coragem do último sorriso
para o rosto bem amado
naquela Noite dos Muros a erguerem-se nos olhos
com as mãos ainda à procura do eterno
na carne de despir,
suada de ilusão.

Ninguém vê as minhas lágrimas, mas choro
todas as humilhações das mulheres de joelhos nos tapetes da súplica
todos os vagabundos caídos ao luar onde o sol para atirar camélias
todas as prostitutas esbofeteadas pelos esqueleto de repente dos espelhos
todas as horas da morte nos casebres em que as aranhas tecem vestidos para o sopro do
silêncio
todas as crianças com cães batidos no crispar das bocas sujas
de miséria...

Ninguém vê as minhas lágrimas, mas choro...

Mas não por mim, ouviram?
Eu não preciso de lágrimas!
Eu não quero lágrimas!

Levanto-me e proíbo as estrelas de fingir que choram por mim!

Deixem-me para aqui, seco,
senhor de insónias e de cardos,
neste ódio enternecido
de chorar em segredo pelos outros
à espera daquele Dia
em que o meu coração
estoire de amor a Terra
com as lágrimas públicas de pedra incendiada
a correrem-me nas faces
— num arrepio de Primavera
e de Catástrofe!

novembro 13, 2007

Ajude a ajudar!

21 de Setembro de 2007








O dia 21 de Setembro é assinalado internacionalmente como o Dia Mundial da Pessoa com Alzheimer.

A Delegação na Madeira da Associação Portuguesa de Familiares e Amigos de Doentes de Alzheimer - ALZHEIMER PORTUGAL, organizou um programa para este dia. Aqui fica o relato feito pelas técnicas da Delegação.

Jantar de Angariação de Fundos
- Teve lugar no Hotel Porto Santo Maria e contou com mais de 100 pessoas, muitas das quais, bem conhecidas da Delegação pois habitualmente são presença assídua nos eventos por ela organizados.
Neste Jantar predominou o simbolismo. Cada uma das mesas encontrava-se identificada com uma das atitudes que almejamos que toda a sociedade tenha face às Pessoas com doença de Alzheimer: solidariedade, respeito, carinho, esperança, dedicação, amizade, apoio, compreensão, ternura, amor, afecto, estima e generosidade.
Tendo em conta o novo slogan da Alzheimer Portugal: “ A indiferença, o abandono e a solidão. São sintomas frequentes da Doença de Alzheimer que você pode curar“, simbolicamente e de forma a contrariar o “sintoma” da indiferença cada um dos presentes foi convidado a acender as velas que se encontravam nas suas mesas, em representação das pessoas com doença de Alzheimer, que se encontram abandonadas à solidão.
Após a refeição procedeu-se ao visionamento de um pequeno vídeo intitulado “Testamento de um Doente de Alzheimer”. Este vídeo teve por base a obra de Lilian Alicke, a Presidente da Associação Brasileira de Alzheimer (ABRAZ) e remete para a importância da Abordagem Centrada na Pessoa.
Finalmente, os participantes foram convidados a pegar num dos balões que se encontravam na sala e, em conjunto, todos foram para o jardim onde, ao som de violino, os balões foram largados, tendo este acto simbolizado o compromisso de cada um de nós para com as Pessoas com Doença de Alzheimer.

novembro 12, 2007

O que é a Doença de Alzheimer?


Se quiser saber um pouco mais sobre esta doença, leia este artigo, publicado pela Alzheimer Portugal no seu site.

Uma grande filme! Uma grande causa!


No próximo dia 21 de Novembro, será exibido o filme "LONGE DELA", no Centro de Congressos do Estoril, às 21h30.

“Longe Dela” é uma maravilhosa história de amor e demonstra de uma forma muito fiel as dificuldades e obstáculos por que passam, diariamente, os cuidadores de pessoas com doença de Alzheimer.
A seguir à exibição do filme a Alzheimer Portugal irá promover um debate.

Os bilhetes podem ser adquiridos no próprio dia, no centro de Congressos, entre as 19h e as 21h e revertem, na íntegra, para o futuro Centro de Dia e Unidade de Internamento Temporário para pessoas com doença de Alzheimer que a Associação irá construir na Alapraia, em Cascais.

novembro 04, 2007

Desorientação espacial


Foi talvez uma das primeiras dificuldades que deste a perceber. A primeira mesmo foram as falhas da memória, sem dúvida.Ainda na idade activa, em pleno exercício da profissão que sempre desempenharas tão bem...
Começaste a ter dificuldade a conduzir. Nunca sabias onde virar, o que fazer num cruzamento ou numa rotunda, qual o caminho a seguir, a não ser que fosse o mais usual, entre casa e o trabalho.
Logo a seguir vieram os confusões nos percursos em casa, entre o quarto e a sala, a casa de banho e a cozinha. Tudo parecia um labirinto.
Depois, a pôr a mesa, as dúvidas quanto ao lugar dos talheres, do copo, dos pratos... Uma vez colocaste os pratos para quatro pessoas apenas em metade da mesa redonda da sala de jantar.
Os conceitos de localização ficaram ininteligíveis: em cima, ao lado, atrás, à direita... nenhuma dessas indicações faz sentido.
Não sabes onde moras, não sabes onde se apagam as luzes, onde se despeja o lixo.
Imagino que te sintas perdida, como uma criança que não sabe onde está e estranha o ambiente à sua volta.Por isso te damos sempre referências simples e te acompanhamos a cada momento, guiando os passos, discretamente.
Estaremos sempre ao teu lado.E saberás por onde seguir.

novembro 02, 2007

novembro 01, 2007

Sugestão de leitura.

Hoje, no blogue da Sofia, encontrei uma sugestão de leitura que me pareceu muito interessante. Aqui fica, com os meus agradecimentos a Sofia.

Uma história de senilidade e loucura

"Heloisa Seixas reconstrói uma trajetória assombrosa com uma tremenda força literária e emocional" – Ruy Castro

As mudanças de personalidade, a depressão, as monomanias, a paranóia psicótica, o medo, as alucinações. Como lidar com alguém que está sendo afetado de forma inexorável pelo mal de Alzheimer? E pior – o que fazer quando esse alguém é sua mãe?

Em O Lugar Escuro, Heloisa Seixas narra uma história real, a sua própria, entrelaçada com um pesadelo familiar. Todas as fases da lenta degradação de uma mente comprometida são descritas de forma minuciosa e assustadora neste livro que, de tão fantástico, às vezes parece ficção, ou "uma espiral assombrada", como define a escritora.

Mas quem já conviveu com pessoas afetadas pelo mal de Alzheimer sabe que a realidade é assim – uma sucessão de memórias perdidas, um vazio que vai tomando tudo, uma realidade fugidia, em que o doente se transforma no avesso de si mesmo. Como quem procura pistas para sair de um labirinto, Heloisa Seixas reproduz essa trajetória, que nos assusta e atrai, com sua dose diária de estranhamento e loucura. Das raízes familiares, num casarão da Bahia, à vida no Rio dos anos dourados, Heloisa faz uma viagem ao passado de sua mãe, esquadrinhando a mente que aos poucos se estilhaça.

O Lugar Escuro é um relato corajoso – narrativa catártica que tem o poder de emocionar, e também de aproximar o leitor desse cotidiano que massacra um número cada vez maior de pessoas e que é a principal causa de demência entre idosos no Brasil e no mundo.

Segundo dados da Academia Brasileira de Neurologia, com o crescimento da população com mais de 60 anos no país – que deve chegar a 24 milhões de pessoas daqui a dez anos – o mal de Alzheimer deve se tornar um problema de saúde pública. Hoje, no mundo, já se contabilizam mais de 20 milhões de casos da doença.

outubro 08, 2007

O que resta?

autoria da foto: isa p

O que resta, do edifício bem construído, sólido, resistente?
Talvez lhe reste a história, perdida a memória.
Talvez lhe restem os alicerces de pedra, destruídos os materiais frágeis que lhe compunham as fachadas.
Talvez lhe reste a alma.
É preciso muito cuidado, para manter o que resta.
Muito cuidado, para manter-lhe a dignidade.
Mesmo na ruina.

outubro 07, 2007

Que força?

Onde iremos buscar força?
Onde nos agarraremos?
A quê?
A quem?

Frágil


Frágil. Tão frágil é o nosso equilíbrio. Tão frágil o nosso cérebro. Tão frágil a nossa vida.

outubro 06, 2007

De mãos vazias


No princípio foi o Aricept.
Depois nada.
Depois acharam que não havia medicamentos para o teu mal.
Outros receitaram Reminyl.
Repetiram.
Repetiram.
Os anos vão passando e as tuas incapacidades cognitivas aumentam assustadoramente.
Mais tarde dizem que receitarão Ebixa, para uma fase mais avançada da tua doença.
Nada.
Esses medicamentos não fazem nada.
Nada fazem que se veja, que se sinta...
Acho que os médicos te passam as receitas só para não sairmos dos consultórios deles de mãos vazias.

Tudo começou...


Há 7 anos. Tinhas então 59 de idade. Toda a gente te achava ainda nova e vigorosa. Ocupavas grande parte dos teus dias a dar aulas, o que sempre fizeste com facilidade e prazer. Os alunos eram a principal motivação da tua existência. Todos eles te achavam a melhor professora. Em cada um que revias, reencontravas um amigo. Abraços, beijos, recordações, sorrisos...

Nesse ano tinhas "uma turma péssima", dizias. Não estavas a conseguir "aguentá-los". Disseste que vinham à primeira hora de aula e faltavam à segunda, escreviam mensagens no telemóvel durante as aulas, mentiam dizendo-te que estavam doentes e não podiam fazer o teste...levando-te, com a tua dedicação e ingenuidade de sempre, a fazer um teste especial para eles, enquanto namoravam no pátio da escola... Tudo situações que costumavas saber enfrentar e resolver, sem crise.

Mas entraste em crise. Não conseguias dormir bem, tu que sempre caíste à cama adormecendo de seguida. Tinhas vontade de chorar, tu que estavas sempre bem disposta e animada.

Não sabias, pela primeira vez, o que fazer. Disseste-me que, às vezes, faziam-te perguntas às quais não conseguias dar resposta. Que, nesses momentos, até nem saberias dizer o teu nome, se to preguntassem. Nunca te tinhas sentido assim perturbada nos 35 anos de ensino da disciplina que adoravas e na qual eras exímia professora.

Passava-se alguma coisa de muito sério.

As amigas disseram-te que eram sintomas de depressão. Que devias ver um psiquiatra.

Consultaste um. Tinhas uma depressão, sim. Mas cedo ele conseguiu ver mais do que isso.

Revelavas os primeiros sintomas de falhas graves de memória, não aqueles esquecimentos que todos temos no dia a dia. Uma bateria de testes específicos feitos em Coimbra, não deixou margens para muitas dúvidas.

O médico receitou-te Aricept, dizendo-te que podias vir a ter a doença do teu pai: Alzheimer. Entendeste que estavas a ser medicada com um preventivo. Nunca disseste que tinhas a doença, mas entendias que talvez a pudesses vir a ter, tal como o teu pai, e a mãe dele.

O diagnóstico veio a ser confirmado por neurologistas mas cedo esqueceste até o que te diziam os médicos. Passaste a rotular o teu estado de ' depressãozinha', pondo-lhe um diminutivo, para parecer coisa de menos importância.

Passados 7 anos, ainda acreditas, ou fazes por acreditar, que sofres de depressão, e que Alzheimer é a doença do teu pai.


outubro 05, 2007

Ainda ontem...


Ainda ontem tinhas a memória intacta.

Ontem não. Há sete anos. Mas parece ter sido ontem.

Sabias tantas coisas! Ciência, livros, música, viagens, fotografia...

Hoje nem sabes que nada sabes.

Há quanto tempo!

Para ti, por ti


Devo-te a melhor parte do meu passado e do meu presente.

Sem ti não teria conhecido quem conheci, vivido com quem vivi, dado ao mundo quem dei.

Foi o destino que te atravessou no meu caminho.

Por isso farás, inexoravelmente, parte do meu futuro.

Mesmo que não tenhamos futuro.

Pelo menos não teremos o futuro que quisemos ter.


Razão de ser


Já tardava!

Há muito que pensava criar este espaço.
Sobre o tema, pesado, de viver com a doença de Alzheimer.

Na esperança, talvez, de conseguir aliviar o peso que carrego, por força de circunstâncias familiares.

Sem medo de usar as palavras.Mas nunca usando o nome de quem falo.

Por favor...Compreendam o pudor.Entendam a sinceridade.

Sintam a dor.Partilhem dela.Para que se torne menor.

Quem souber do que falo, saberá que não exagero.

Tudo o que disser será verdade. Acontecida. Vivenciada.

Talvez alguém encontre aqui alguma coisa que lhe toque. Talvez lhe sirva a minha experiência...

Talvez do que aqui ficar, fique uma memória. Sobre quem já a perdeu.

Talvez ainda haja tempo...

Talvez...